Gosto de reler livros muito tempo depois de tê-los lido; parecem
outros...como se o autor magicamente os houvesse mudado.
Somos
nós que mudamos...Aquela frase que passou desapercebida pode na releitura fazer
bater mais forte nosso coração...A descrição daquele lugar que nos pareceu
maçante, numa releitura pode dar a sensação de um déjà vu mesmo que ele exista
apenas na imaginação do autor. A descrição daquela obra de arte....hoje nos já a
conhecemos. Aquela dor...nos já a sentimos “na pele”, aquele sentimento, aquela
alegria, aquela saudade, aquele cheiro....Amadurecemos também para a leitura, e
em algum momento nos identificamos com o autor. Têm aqueles livros
que podemos ler todos os dias pelo simples prazer de sonhar, são alimentos para
a alma....Acabei reeeeler “Um mundo num grão de areia”de Rubem Alves.... eu o
ganhei de presente há três anos.
Fui daquelas adolescentes mais que tímidas....envergonhada! Nas emoções passava
a falsa idéia de indiferença, principalmente diante de pessoas que admirava.
Ídolos? Parecia não tê-los; aplauso discreto...só o brilho dos olhos não
conseguia disfarçar. Invejava as amigas que se descabelavam e gritavam “bis”,
pediam autógrafos, fotos..e eu lá num canto...como quem não estava nem aí. O
tempo passou, a timidez bem resolvida deixou de incomodar, e os ídolos são
outros.
Há aproximadamente 12 anos estava com meu marido em São Paulo para um encontro
de Conselhos de Medicina, quando do ônibus que nos levaria até o evento, vi e
chamei a atenção de nossos amigos para uma cena insólita; um jovem desceu de seu
carro, tirou o sobretudo que vestia e o deu à um mendigo que imediatamente o
vestiu, e diante de seu benfeitor se pôs a dançar de alegria sob a garoa fria da
noite paulistana ...todos aplaudiram.
Quando chegamos ao nosso destino, embevecida com o lugar esqueci o episódio do
mendigo; Centro Cultural Julio Prestes, linda e imponente Sala São Paulo,
recentemente restaurada e exibindo sua magnífica arquitetura aliada aos modernos
e sofisticados recursos de acústica e conforto. De repente meu marido me chamou
e pediu para que eu contasse em detalhes, o que havia visto na rua para um
pequeno grupo de pessoas que eu não conhecia. Um deles se mostrou mais
interessado, e conversamos por algum tempo sobre as surpresas com que uma São
Paulo noturna pode nos presentear. Apaixonada por São Paulo e suas
peculiaridades o “papo” fluiu agradavelmente, e em algum momento comentei que
pra ver o que a cidade nos oferece é preciso ter “olhos” para enxergar; então
ele silenciou por alguns instantes e disse: “Isso daria uma crônica”. Senti meu
rosto enrubescer como quando tinha 15 anos, e travei...não disse mais nenhuma
palavra....Só então me dei conta que aquele homem elegante e simpático era Rubem
Alves, de quem sou fã desde a primeira leitura, e que lá estava para ministrar
uma palestra....A timidez não estava assim tão bem
resolvida....
Cerca de três anos atrás, telefonei para nosso amigo Gerson,convidando-o para a
festa de aniversário de sessenta anos de meu marido. Estando ele na presença de
Rubem Alves de quem é amigo pessoal, comentou; “ é a Rosa do Sallim me
convidando para o aniversário dele, vou levar um dos teus livros de presente”. E
Rubem Alves lhe deu três livros autografados; não para o aniversariante,
mas...”Para a Rosa do Sallim com carinho”; são o meu precioso
tesouro...Certamente ele não se lembra da conversa que tivemos e nem tem idéia
que a “Rosa do Sallim” já era sua leitora há muito tempo. Também não sabe que
quando leio seus livros, meus olhos brilham e minha alma aplaude pedindo
bis.
Rosa
Marin Emed.
Rosinha, muito obrigado e um grande abraço.
PS: Para deleite do Raul.
Bela crônica Rosinha! Como todas as que você escreve. Voicê tem razão. As releituras nos mostram diferentes nuances, imagens e interpretações distintas. Há um mês se deu comigo, quando estava ao lado de Maiza e ela estava assistindo um capítulo da novela das 18 hs (Lado a Lado) e, num determinado momento foi citado o nome do jornalista João do Rio. Imediatamente me lembrei do livro que li (presente de minha madrinha Iza) sobre esse personagem da vida carioca do início do século 20. Fui à estante, tomei o livro em minhas mãos e o relí em exatas 3 horas, ininterruptamente.
ResponderExcluirRosinha, fiz uma interpretação completamente diferente da primeira. Que coisa estranha e maravilhosa!
Um grande reabraço a você!!! Continue com suas crônicas maravilhosas.
Eh mesmo muito bom! Isso acontece também com o cinema. Quando estudante de psicologia, tínhamos na faculdade o "Clube do Cinema", do qual faziam parte alunos e professores de cursos diferentes; psicologia, história,filosofia, letras e sociologia. Assistíamos juntos o filme e depois de expormos nosso entendimento e aprendermos com os demais, revíamos o mesmo filme que nos parecia outro...Muitas vezes o mestre é o tempo. Sempre que viajo, prometo que antes da próxima viajem vou ler sobre os lugares que visitarei pra enriquecer o que verei e aprenderei; por falta de tempo ou preguiça, nunca cumpro...Mas a segunda visita é sempre mais enriquecedora...como a releitura...
ResponderExcluirUm grande abraço ZSylvio, mais uma vez obrigado pelo estímulo.
Rosa Marin Emed.
Que lindo Ró, parabéns. bjs
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