VF – Atualmente, o senhor preside o Circuito Ferroviário Vale Verde (CFVV), através do projeto “Expresso Vale Verde”, em Lavras-MG. Por favor, nos fale um pouco dessas iniciativas e seus objetivos.
César Mori – Ocorreu quando eu voltei para o Brasil... Cheguei aqui e encontrei uma ferrovia completamente sucateada, esquecida, depredada. E isto me causou um impacto muito grande. Como já disse, sou filho de ferroviário e cresci entre os trilhos, entre os trens, uma inesquecível experiência que acredito me tornou o homem que sou. Ao passar do tempo, este impacto visual da destruição, do abandono e a perda de toda aquela magia, incomodava minha alma, pelas lembranças dos tempos de glória, de poder, que significava a ferrovia para quem a conheceu no passado. Não era possível de entender tudo aquilo que eu estava presenciando. Realmente inacreditável que aquela grande empresa estatal, símbolo do poder de uma nação que se ergueu pela ferrovia, estivesse assim, tão decadente e esquecida, como se fosse simplesmente um objeto estragado. A partir daí, depois deste choque visual, uma força se ergueu em meu âmago e me fez como do nada, descobrir em mim uma força interior capaz de sustentar uma luta pela preservação ferroviária e pela sua revitalização. E hoje estamos a um passo de conseguir nosso objetivo, que só foi possível pela cooperação mútua, determinação, busca incansável por conhecimento e sem dúvida alguma, do trabalho em conjunto de todos que lutam pelas ferrovias brasileiras. A eles, só tenho a agradecer, pois sozinho ninguém chega a nenhum lugar...
VF – Como o senhor vê o processo da privatização das companhias ferroviárias, ocorrido no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso?
César Mori – Não houve privatização das ferrovias no Brasil, mas um contrato de comodato, uma concessão de uso por um período. Isto foi ruim porque as empresas ganhadoras, elas abandonaram a ferrovia brasileira, simplesmente porque não interessava a elas o transporte de passageiros, ou cargas de baixo valor. Então vimos aos poucos que muitos trechos de ferrovia foram abandonados a própria sorte e completamente pilhados pelos ladrões que viram então uma ótima oportunidade para vender os trilhos que eles mesmos cortavam a noite, às vezes, até durante o dia. Assim pudemos todos ver a decadência da ferrovia no Brasil a olhos nus... Para muitos de nós, preservacionistas, um momento de tristeza e reflexão tudo que temos encontrado pelo país afora. Então, tudo que se vê é fachada e a realidade é outra muito diferente do que passam para o povo brasileiro.
'O Brasileiro destrói sua história, destrói a sua memória de um passado de glórias,
de trabalho e, sobretudo, de muito amor pela nossa pátria'
César Mori Júnior, um entusiasta das ferrovias no Brasil.
César Mori Júnior nasceu em 1960, na cidade Lavras, na região Centro-oeste de Minas Gerais. Filho de servidor ferroviário, ele se formou como técnico em informática e web designer, mas desde cedo se apaixonou pelo mundo dos trilhos e das locomotivas. Atualmente dirige o Circuito Ferroviário Vale Verde
(CFVV), através do projeto “Expresso Vale Verde”, que visa fomentar o turismo em um trecho de linha férrea na região de Lavras. Nessa entrevista, ele nos conta como foi levado a se transformar num preservacionista das ferrovias nacionais e, entre outros assuntos, ele nos imprime também as suas considerações sobre o colapso a que passa o transporte coletivo pelos trilhos do Brasil.
'Os bilhões de reais que utilizaríamos para este TAV poderiam
criar vários trens regionais de média velocidade no Brasil'
'O Brasileiro destrói sua história, destrói a sua memória de um passado de glórias,
de trabalho e, sobretudo, de muito amor pela nossa pátria'
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