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.- A ÁRVORE QUE O SÁBIO VÊ, NÃO É A MESMA ÁRVORE QUE O TOLO VÊ! William Blake, londrino, 1800.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

O sistema de saúde tem de funcionar bem para não parecer que o paciente vale mais morto do que vivo.



Grato ao amigo Sylvio pelo envio deste importante texto, que nos leva a profunda reflexão. As imagens ilustrativas foram selecionadas pelo blog e colhidas no Google.


Caro Sylvio, te encaminho em anexo artigo meu publicado no jornal Zero-Hora da última quarta-feira (07/10) sobre os transplantes de órgãos.


Devido a grande repercussão que teve no estado, gostaria de divulgá-lo nacionalmente, não sei como, visando contribuir com esta questão e mostrando, se leres o texto, que não bastam campanhas de doação, se não se melhorarem as condições da saúde pública, que é de onde vem a maioria dos órgãos para transplante. Imagina as condições desta mãe para doar os órgaos do filho.
Abs
Fernando Souza


SOBRE OS TRANSPLANTES

Todos sabemos que o principal gargalo na questão dos transplantes de órgãos é a doação. O que talvez poucos saibam é que a questão da doação está intimamente relacionada à qualidade do serviço de saúde pública que é prestada no país.

Exemplifico com um caso pessoal: em um hospital universitário de referência da região central do estado do RS, único com estas características que atende pelo SUS uma população de aproximadamente um milhão e quinhentos mil habitantes de 25 municípios vizinhos, chegou, no serviço de emergência, acompanhado pela mãe, um paciente masculino de 22 anos, motoboy, que tinha caído da motocicleta 15 minutos antes, tendo batido a cabeça que estava protegida com capacete. Devido ao excesso de pacientes presentes no local, o atendimento demorou um pouco mesmo tratando-se de trauma que tem prioridade. Ao ser atendido, o paciente relatou ao médico que estava bem, sentindo somente uma leve dor de cabeça. Ficou então em observação em uma cadeira, já que as macas e leitos estavam todos ocupados no momento. Algumas horas mais tarde, ao ser reavaliado, estava um pouco sonolento, porém respondia com exatidão as perguntas formuladas. Novo período de observação, ao fim do qual estava francamente sonolento respondendo mal as perguntas. Foi então indicada tomografia de crânio, a fim de avaliar possível trauma cerebral. Havia muitos pacientes para fazer tomografia e, mesmo tratando-se da prioridade do trauma, foram

mais vários preciosos minutos para se constatar, ao final do exame, que havia lesão cerebral difusa, não passível de tratamento cirúrgico. A mãe, durante todo este período, desde sua chegada, permanecia quieta e apreensiva, limitando-se a observar os fatos que ocorriam. Uma vez feito o diagnóstico, foi indicada internação no CTI. Novo problema. Não havia vaga disponível mesmo se tratando de trauma em pessoa jovem. A ansiada vaga só se disponibilizou muitas horas mais tarde e após um período de avaliação segundo protocolo para estes casos, a mãe foi informada que o filho não apresentava mais atividade cerebral. Sendo assim, paciente jovem, “saudável”, com trauma exclusivamente cerebral, foi indicado como potencial doador de órgãos.

Então, a mãe veio me procurar com a seguinte pergunta: “doutor, quando o meu filho chegou aqui ele estava bem, foi deixado em observação no meio de toda aquela gente, ele foi piorando e aconteceram todas aquelas dificuldades para se conseguir o exame e depois para colocá-lo no CTI. Agora ,quando me dizem que ele está “morto”, vem um avião de Porto Alegre com “cinco” médicos para atendê-lo. Mas do que serve isto agora? Porque não fizeram isto antes quando ele estava “vivo”?”.

Certas perguntas não tem resposta.

O sistema de saúde tem de funcionar bem para não parecer que o paciente vale mais morto do que vivo.

Fernando de Oliveira Souza

Médico e professor universitário

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